quarta-feira, 19 de maio de 2010

DEMOLIÇÕES E DESLOCAÇÕES FORÇADAS EM ANGOLA


DECLARAÇÃO ACERCA DE DEMOLIÇÕES E DESLOCAÇÕES FORÇADAS EM ANGOLA SUBMETIDA À 47ª SESSÃO DA COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS

Ex.ma e Caríssima Sra.Presidente da Comissão,
Ex.mos Srs.Comissários,
Distintos Convidados
Vamos apresentar esta declaração em nome da ACC de que sou Presidente, sendo eu, igualmente portador do grito lancinante das vítimas de recentes demolições de casas e deslocações forçadas no Lubango, Angola.

Breve historial
O assunto de demolições de casas e deslocações forçadas em Angola pode ser datado desde 2001. No entanto, poucas famílias têm sido compensadas por perdas resultantes de tais actos. Entretanto, nos últimos anos, têm estado a acontecer repetidos casos de demolições pelo país, com especial destaque para as províncias de Luanda, Benguela e Huila. Uma das características típicas desses actos de remoção é a utilização desproporcionada da força contra civis desarmados. Para além disso, algumas dessas deslocações forçadas têm por bases motivacionais interesses de entidades de sectores privados.

Impacto de demolições de casas e deslocamentos forcados recentes
Em Marco último, por Decreto n.80/GPH/2010, o Governo Provincial da Huila baixou ordens às competentes autoridades para levar avante um processo de demolições e de deslocamentos forçados de 3081 casas na cidade do Lubango, muitas delas pertencentes a famílias deslocadas de guerra e de renda baixa. A razão para tal é que as referidas casas foram construídas no perímetro próximo demais do caminho-de-ferro inter-provincial. Entretanto, a implementação do decreto acima mencionado levou à criação de mais de dez mil pessoas deslocadas internas em situação de emergência humanitária. Para além disso, o governo não providenciou abrigos para os que foram forçosamente arrancados dos seus prévios lugares, tendo sido enviados a 10 quilómetros de distância, numa área onde faltam serviços básicos tais como água, condições de sanidade, electricidade, sem falar de serviços básicos subsidiados tais como a saúde e educação. Além disso, tudo isto aconteceu no pico mais alto da estação chuvosa em que as pessoas precisavam elas mesmas de abrigo para se protegerem e o solo não era apropriado para acomodar as pessoas porque estava cheio de nascentes de água. De acordo com as fontes do Governo, uma criança morreu no processo de deslocamentos forçados. De facto, o impacto de tal medida levou a um indescritível e traumático sofrimento, especialmente sobre os grupos vulneráveis.
As outras fases de demolições de residências estão planeadas para terem lugar no próximo mês de Junho, envolvendo 800 casas, ao longo da linha férrea, na Província da Huila. No entanto, até agora, não foram criadas alternativas para remediar a necessidade de abrigos e outras condições sociais para as pessoas que virão ser afectadas. A última fase irá incluir aquelas pessoas a viverem ao longo dos leitos dos rios, debaixo dos cabos de electricidade e finalmente, todos os casebres e construções informais espalhadas pela cidade do Lubango.

Em face destes eventos recentes, a ACC apresenta à Comissão dos direitos Humanos e dos Povos a seguinte declaração:
• A ACC reconhece a necessidade imperativa para a reconstrução urbana depois da destruição de infra-estruturas durante os 27 anos de Guerra civil;
• Por outro lado, a ACC acredita que as demolições de casas e deslocações forçadas acima mencionados, foram conduzidos em contravenção a convenções e paradigmas internacionais e de leis internas;
o A ACC acredita que o Artigo 11, par.1, da Convenção Internacional dos direitos Económicos, Sociais e Culturais que reconhece o direito à qualidade de vida incluindo habitação adequada foi violado;
o Os Princípios e Directrizes Básicas sobre Deslocamentos Forçados, nº33, do relator Especial para Habitação Adequada em relação aos grupos vulneráveis, especialmente crianças, idosos, mulheres gestantes e os portadores de deficiência, não foram observados;
o O mesmo se aplica à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, ratificado pelo Governo de Angola em Janeiro de 1991. Esta Carta diz no seu Artigo 14, que os Estados devem garantir o direito à propriedade;
o O Artigo 37 da Constituicao Angolana e a Resolução 37/2009 da Assembleia Nacional em relação à compensação das pessoas e/ou à criação de condições apropriadas antes de proceder aos deslocamentos forcados e demolições de residências foram igualmente violados.

Recomendações
Diante destes cenários, a ACC propõe gentilmente à Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e em extensão à União Africana, para solicitar ao Estado Angolano para levar avante as seguintes medidas:
1. Cancelar todas as demolições e deslocamentos forçados e criar uma lei sobre a material em consonância aos parâmetros das leis internacionais e da legislação interna;
2. Compensar todas as vítimas de demolições e deslocamentos forcados de acordo com as leis e directrizes internacionais, bem como em responsabilizar todas as instituições governamentais e entidades do sector privado responsáveis por ilegais e desumanos actos de deslocamentos forçados;
3. Solicitar ao Relator Especial da Comissão Africana sobre os Deslocados Internos, Refugiados e Requerentes de Asilo, a levar avante uma missão de constatação a Angola, como um meio de encorajar o Governo de Angola a ter directrizes claras e específicas relativas ao direito à habituação adequada;
4. Cumprir com as recentes recomendações ao Estado Angola, saídas do Exame Periódico Universal das Nações Unidas, nas questões específicas do direito à habitação adequada;
5. Solicitar ao Governo Angolano a requerer a visita da Relatora Especial das Nações Unidas para a Habitação Adequada para ajudar a construir as directrizes internacionais em relação ao direito à habitação adequada em Angola;
Senhora Presidente, Excelentíssimos Srs.Comissários, Distintos Convidados,
A ACC acredita, onde há um problema, existe sempre uma solução. Nós estamos profundamente agradecidos à sociedade africana e global, que se ergueu a favor das vítimas do Lubango. Finalmente, A ACC acredita que as presentes recomendações poderiam contribuir para a prevenção de novos conflitos e impulsionar uma duradoira e sustentável paz em Angola.
Muito obrigado Senhora Presidente
Lubango, 12 de Maio de 2010.

O Presidente da ACC , Pe.Jacinto Pio Wacussanga
Associacao Construindo Communidades (Association for Building Communities)
Bairro Dr. António Agostinho Neto (Lage).
Telefone Nº00 244 261220519
a.c.c.@nexus.ao
Lubango – Angola
NOTA: Esta Declaração foi lida durante a Sessão da Comissão de 15 de Maio de 2010

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