quinta-feira, 16 de julho de 2009

G8 – A oportunidade perdida ou a esperança num futuro melhor?


A cimeira do G8 talvez seja uma oportunidade perdida para as comunidades pobres. A reunião de L’Aquila tinha todas as condições para que os países mais ricos pudessem assumir um importante compromisso para resolver o problema da pobreza mundial e que traduzisse o impulso do acordo conseguido no final de 2008 em Copenhaga. Apesar de ficar longe das expectativas inicialmente previstas, o encontro do G8 trouxe sinais de esperança para o futuro, com pequenos passos que foram dados para selar acordos determinantes em matérias sensíveis como as alterações climáticas e a segurança alimentar. As anteriores promessas relativamente aos níveis de ajuda e às metas na saúde voltaram a estar em cima da mesa das negociações, mas desta vez sem a urgência que era requerida e sem um plano mensurável para a sua concretização. O G8 sofre de uma doença anacrónica porque países observadores como a China e a Índia têm um peso no cenário internacional muito superior a alguns dos actuais membros como Itália ou Canadá. A próxima cimeira do G8 será determinante para os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Em 2010 assinala-se dez anos após a celebração do Jubileu de 2000, cinco anos depois do movimento da sociedade civil Make Poverty History e apenas cinco anos para se alcançar as metas do Milénio e reduzir para metade a pobreza extrema. Das conclusões da reunião do G8 destacam-se cinco áreas de vital importância para a melhoria do nível de vida das populações que se encontram no fosso da pobreza extrema.

1. Alterações Climáticas
Na sequência das negociações de Copenhaga os líderes do G8 comprometeram-se a manter o aumento da temperatura abaixo dos 2 graus. Para isso é necessário reduzir as emissões de carbono em mais de 80% dos níveis actuais até 2050, de forma a se alcançar os valores registados em 1990. A aceitação destas metas pela Administração Obama representa uma significativa viragem na política ambiental norte-americana que nunca ratificou o Protocolo de Quioto. No entanto faltou vontade política para definir metas intermédias que garantam uma monitorização do processo e uma convergência com os Objectivos do Milénio. Não houve acordo quanto ao financiamento para aumentar a Ajuda Pública ao Desenvolvimento num pacote autónomo aos 0,7% do Rendimento Nacional Bruto consignado na Declaração do Milénio e que permita aos países em desenvolvimento a adopção de políticas sustentáveis para reduzir as emissões de carbono. Paralelamente à cimeira do G8, o discurso de Obama no Fórum Económico constitui um forte apelo aos Ministros das Finanças para que voltem à mesa das negociações durante o encontro do G20 em Setembro e tragam propostas concretas para ajudar os países pobres na resposta às alterações climáticas. Estudos independentes mostram que nos últimos dez anos os desastres naturais causados pelo aquecimento global do planeta provocaram mais de 500.000 mortes e afectaram a vida de 2,5 biliões de pessoas, implicando um custo estimado de mais de 450 biliões de euros em perdas económicas.

2. Água e Saneamento
Os líderes do G8 tinham sido desafiados a construir um quadro global de acção para inverter a actual crise relativa à falta de água e saneamento que assola as populações em África e que se traduz num rácio de uma em cada oito pessoas que não tem acesso a água potável e mais de 2,5 biliões de seres humanos que estão privados de uma casa de banho e de saneamento básico. Apesar do forte compromisso em matérias relacionadas com a saúde, os líderes do G8 foram incapazes de reconhecer que a diarreia é o segundo factor causador da mortalidade infantil até aos cinco anos e que a água e o saneamento são condições determinantes para cumprir as metas em termos de saúde materna e infantil e em outras questões periféricas como a educação e as migrações forçadas que afectam as populações mais pobres e vulneráveis do planeta. As conclusões da cimeira resumiram-se a vagas intenções sem a definição de uma agenda estratégica e à ausência de uma forte vontade política em corrigir injustiças que se colocam ao nível dos direitos humanos mais elementares.

3. Governação e Corrupção
O apelo para a ratificação da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (UNCAC) constitui um dos pontos altos da cimeira, mas enquanto a Itália, Alemanha e Japão não ratificarem o acordo, a mensagem transmitida aos países emergentes é “façam o que dizemos, mas não o que fazemos”. A UNCAC constitui uma das poucas ferramentas globais que obriga os Estados-membros da ONU a combater a corrupção. Sem a ratificação do documento é impossível uma acção consertada para reduzir os paraísos fiscais e detectar branqueamento de capitais na origem. Os G8 apelaram para a implementação de um mecanismo mais eficaz e transparente que permita a revisão da Convenção e a converta numa verdadeira task force global. Neste processo de prestação de contas, torna-se vital a participação da sociedade civil e de organismos independentes e tecnicamente credíveis para monitorizar a corrupção nos diferentes países, invertendo a actual realidade de políticas ineficazes e leis fragmentadas de combate ao tráfico de droga e ao crime organizado em cada contexto nacional.

4. Segurança Alimentar
O novo compromisso para mobilizar 20 biliões de dólares nos próximos três anos constitui o ponto mais alto das conclusões da cimeira do G8. Apesar da grandeza dos montantes envolvidos, os doadores deveriam ir mais longe e aumentar a ajuda anual até 30 biliões de dólares, de forma a permitir que os pequenos agricultores dos países em desenvolvimento possam produzir ou comprar bens alimentares suficientemente nutritivos e resistir aos períodos de seca, inundações ou flutuação dos preços dos alimentos. Os doadores deverão assegurar a reforma de algumas instituições, garantindo que a ajuda internacional seja permanentemente monitorizada e aplicada através de políticas locais sustentadas que envolvam a boa gestão dos recursos hídricos, energia e infra-estruturas, como complemento de medidas que abrangem a protecção social, a agricultura, a nutrição, a redução do risco de desastre e a adaptação às mudanças do clima. Actualmente uma em cada seis pessoas é vítima da fome ou da subnutrição.

5. VIH/SIDA
As novas promessas de acesso universal à prevenção e tratamento do VIH/SIDA, malária e tuberculose deveriam ser consubstanciadas com um plano de acção que incluísse uma grelha detalhada de distribuição da ajuda e a introdução de políticas inovadoras que permitissem o reforço dos sistemas de saúde e novas formas de combate às doenças endémicas, através da investigação científica, educação e outras medidas estruturais.
Um mundo sem pobreza extrema pode continuar a ser uma utopia, mas enquanto for possível tentar temos a certeza de que o mundo será sempre melhor.
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João Pedro Martins
Coordenador Nacional
Desafio MIQUEIAS - MICAH Challenge Portugal
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