terça-feira, 12 de julho de 2011

Sudão do Sul: finalmente independente


Primeiro país em reconhecer a nova nação foi o próprio Sudão

ROMA, terça-feira, 12 de julho de 2011 (ZENIT.org) – Em uma atmosfera quase de estádio de futebol – com gente até tocando vuvuzelas –, o Sudão do Sul viveu, no último dia 9, o tão esperado dia da sua independência do Sudão, tornando-se oficialmente o 54º país do continente africano e o 193º do mundo.
Na solene cerimônia, realizada na capital Juba, no mausoléu do líder independentista John Garang, que morreu em um acidente de helicóptero em julho de 2005, participaram dezenas de milhares de pessoas, formando, segundo a Neue Zürcher Zeitung (9 de julho), a mais numerosa concentração humana jamais vista na cidade situada às margens do Nilo Branco.
A celebração começou com as orações lidas por dois líderes religiosos, um muçulmano e outro cristão, Dom Paulino Luduku Loro. “Que Deus dê alegria a todo o nosso povo”, rezou o arcebispo católico de Juba, que quis recordar todos os que “nos expressaram sua solidariedade durante os longos anos de guerra” e pediu, além disso, um “novo entendimento” entre o Norte e o Sul (Agence France-Presse, 9 de julho).
O cume do evento chegou quando se recolheu a bandeira sudanesa e se içou a da República do Sudão do Sul, que, depois de Eritreia (1993), é a segunda nação africana nascida de uma secessão. A independência de Juba foi precedida por uma longa e sanguinária guerra civil entre o Norte muçulmano e o Sul animista e cristão que, explodindo em 1955, durou (com uma pausa de 1972 a 1983) até a assinatura do Acordo Geral de Paz (CPA), que se realizou em 9 de janeiro de 2005, na capital do Quênia, Nairóbi, entre o presidente sudanês, Omar Hassan al-Bashir, e os rebeldes do Movimento/Exército Popular para a Libertação do Sudão (SPLA/M) de Garang.
Calcula-se que a segunda fase da guerra civil – a mais cruenta – causou quase 2 milhões de vítimas e mais de 4 milhões de deslocados. “Nossos mártires não morreram em vão”, destacou o presidente do Sudão do Sul, Salva Kiir Mayardit, dirigindo-se à multidão (BBC, 9 de julho). “Esperamos mais de 56 anos até este dia. É um dia que ficará gravado em nossos corações e em nossas mentes”, continuou o ex-chefe rebelde, que usava seu já característico chapéu preto de cowboy.
O primeiro país em reconhecer o Sudão do Sul na sexta-feira foi o próprio Sudão. Segundo a agência Reuters (9 de julho), trata-se de um gesto de boa vontade da parte do regime de Al-Bashir, sobre cuja cabeça pende ainda uma ordem internacional de captura emitida pelo Tribunal Penal Internacional (ICC) de La Haya (Holanda) por crimes de guerra e contra a humanidade, cometidos em Darfur entre 2003 e 2004. Al-Bashir participou também da cerimônia de independência. “Nós nos alegramos com os nossos irmãos do Sul pela criação do seu novo Estado. Compartilhamos sua alegria e sua festa. A vontade das pessoas do Sul deve ser respeitada”, disse o homem forte de Cartum, que pediu aos Estados Unidos que levantasse as sanções contra o seu país (BBC, 9 de julho).
Todos concordam em que, com a independência, começa o verdadeiro trabalho para Juba. Os desafios que esperam o país, um dos mais pobres do mundo, são enormes. O primeiro deles é o da segurança, não só a exterior, mas também a interior. Sobre o terreno do Sudão do Sul agem pelo menos sete movimentos de rebeldes que, segundo Juba, são financiados por Cartum. Para muitos especialistas, o verdadeiro inimigo do Sudão do Sul se esconde, de fato, dentro do país, e são a corrupção e as divisões étnicas.
Depois estão os complicados assuntos das fronteiras com o Sudão, da dívida sudanesa e sobretudo o do petróleo. Enquanto a maior parte dos jazimentos sudaneses (pelo menos 75%) se encontram no território do Sul, a infraestrutura para a exportação do ouro negro ficou nas mãos de Cartum. Ainda que o Sudão do Sul se veja obrigado a chegar a um acordo com o Norte, tudo indica que, para seu desenvolvimento econômico, precisará sobretudo da ajuda dos seus vizinhos Etiópia, Quênia e Uganda.
Como recorda a Reuters (6 de julho), o Sudão do Sul é, de fato, o principal destinatário das exportações ugandesas, que, segundo Uganda Exports Pormotions Board, chegaram, em 2009, a um volume de 184,6 milhões de dólares. No mesmo ano, o Quênia exportou bens e serviços no valor de 157,7 milhões de dólares rumo a Juba. Segundo um informe do centro de consulta Frontiers Economics, uma possível retomada da guerra no Sudão do Sul custaria aos seus vizinhos até 34% do seu PIB combinado durante um período de 10 anos. Juba é, além disso, o candidato mais provável para tornar-se membro da Comunidade da África Oriental (EAC), se os atuais Estados membros (Burundi, Quênia, Ruanda, Tanzânia e Uganda) decidirem ampliar este grupo.
Para o seu desenvolvimento, Juba tem, talvez, um surpreendente ás na manga: poderia tornar-se um destino para os amantes do safári. Como recordou o jornal espanhol El mundo (10 de julho), no Sudão do Sul se esconde um Serengeti “secreto”. Exploradores da sociedade zoológica de Nova York (Wildlife Conservation Society ou WCS) e do National Geographic descobriram, em 2006, uma grande migração em massa de herbívoros, quase maior que a do famoso Parque Nacional do Serengeti, na Tanzânia. Nesta migração participaram até 1,4 milhão de antílopes e outros herbívoros. Junto ao oeste da Etiópia, a região do Sudão do Sul onde se verificou esta migração forma, segundo El Mundo, o maior ecossistema de savana ainda intacto de toda a África.
Enquanto isso, a prioridade absoluta é a criação – quase do zero – de um sistema de saúde e educativo. Com uma população igual à de Milão e Roma juntas – observa Il Corriere della Sera (9 de julho) –, o novo país africano tem menos de 449 mulheres diplomadas na escola superior. Para ajudar neste colossal desafio, as autoridades do Sudão do Sul – um país no qual 1 de cada 10 crianças morre antes dos 5 anos e 1 de cada 10 mulheres morre antes ou depois do parto – há 400 ONGs ativas, além da Igreja Católica. Nestes anos, a diocese de Torit pretende, por exemplo, dedicar 9 milhões de dólares a projetos de desenvolvimento (La Croix, 1º de abril).
(Paul De Maeyer)

sexta-feira, 8 de julho de 2011

9 Julho: Independência do Sudão do Sul


Sudão do Sul: orgulhoso por ser nova nação
Bispo de Rumbek destaca importância deste acontecimento histórico
ROMA, sexta-feira, 8 de julho de 2011 (ZENIT.org) – Um “caminho sereno” rumo à declaração de independência que amanhã, em Juba, tornará oficial o nascimento do 54º Estado africano, Sudão do Sul.
Apesar os duros enfrentamentos que no mês de junho devastaram o sul de Kordofan e os milhares de desalojados, privados de assistência adequada em Darfur e Abyei, Dom Cesare Mazzolari, bispo da diocese de Rumberk, tende a destacar a grande esperança e o entusiasmo vivido pelo povo do Sudão do Sul na véspera deste importante dia.
“O Sudão do Sul – afirma – está orgulhoso por ser uma nova nação e está preparado para conquistar sua própria identidade no mundo.”
De fato, 9 de julho de 2011 representa uma data histórica: nunca, desde a década de 60, ou seja, desde a época da descolonização do continente africano, foram colocadas em discussão as fronteiras traçadas pelos estados coloniais (exceto pela secessão da Eritreia da Etiópia, em 1993).
A independência do Sudão do Sul, que marca o fim do período de transição estabelecido nos acordos de paz de 2005 e que foi aprovada pelo referendo popular do último dia 9 de janeiro (que decretou, com 98,83% dos votos, a secessão do Norte do país), foi paga com outro tributo de sofrimento. Quase 50 anos de guerra, marcados pelas fases sanguinárias de 1955 a 1972 e de 1983 a 2005, dois milhões de mortos e quatro milhões de prófugos e deslocados.
Dom Mazzolari, há 30 anos em missão no Sudão, foi testemunha de grande parte deste processo, colocando-se ao lado dos mais pobres e esquecidos, lutando para que lhes chegasse a assistência sanitária e pelos programas de desenvolvimento que fazem parte dos direitos fundamentais da pessoa.
Este é um papel importante da Igreja a serviço de um povo que é o 150º (de 182) mais pobre da terra. “A Igreja – observa Dom Mazzolari na véspera da independência – perseverou na oração e na difusão da fé em Deus, incentivando o compromisso rumo à reconciliação, em uma região repleta de conflitos, divisões e problemas tribais.”
“A voz e o testemunho da Igreja – acrescenta o bispo de Rumbek – é clara e luminosa e, depois de muitos anos de sofrimento, o Senhor está se manifestando graças à semente da fé cristã, que está crescendo no Sudão do Sul.”
O Sudão, para o bispo comboniano, “precisa se entregar a um Deus que ama esse povo, enquanto a Igreja universal deve guiar as iniciativas de solidariedade para com o Sudão do Sul, para que o povo possa sentir-se parte da família global através de sinais de comunhão”.
Ainda que o território do emergente Sudão do Sul seja muito rico em água e petróleo, 90% da população vive com menos de 1 dólar ao dia, enquanto o analfabetismo dos adultos é de 84%. À taxa mais alta do mundo de mortalidade das mulheres no parto ou aos problemas durante a gravidez une-se a desnutrição de quase a metade da população infantil.
Hoje, o Sudão do Sul é uma região cujo sistema econômico deve ser reconstruído, a saúde e a educação devem ser refundadas e é preciso criar as infraestruturas necessárias para o desenvolvimento. Também o recurso do petróleo – que representa 98% do balanço estatal – tem de fazer contras com a falta de oleoductos e de refinarias.
“Precisaremos – explica Mazzolari – do apoio internacional sobretudo nos próximos anos, para tornar-nos membros da comunidade global.”
As celebrações oficiais da independência, informa uma nota da Coordenação de Entes Solidários em Rumbek, começarão amanhã, 9 de julho, às 10h, em Juba, no mausoléu de John Garang, político e guia do Exército Sudanês de Libertação Popular (SPLA) na 2ª Guerra Civil (1983-2005).
Além do presidente do Sul do Sudão, Salva Kiir Mayardit, de Cartum se unirá também Omar El-Bashir, atual presidente da República do Sudão. “A presença de El-Bashir – destaca a nota – é um sinal da vontade de diálogo e cooperação entre o Sudão e o Sudão do Sul.”
Como bênção à nação nascente, está previsto que, antes da proclamação da independência, representações cristãs e muçulmanas (o Sudão do Sul conta com quase 9 milhões de habitantes, a maioria composta por cristãos e animistas) se reunirão para um momento de oração comum.
À assinatura da constituição da República do Sudão do Sul por parte do presidente Salva Kiir, seguirão as intervenções das delegações internacionais. Entre elas, a Liga Árabe, expoentes do governo chinês, representantes da União Europeia e dos Estados Unidos, da presidência da União Africana e o secretário das Nações Unidas, Ban Ki Moon.
Depois dos momentos institucionais, a palavra será dada ao esporte. No dia seguinte, domingo 10 de julho, no Juba Footbal Stadium, a nova seleção de futebol do Sudão do Sul enfrentará a seleção do Quênia. Já no dia 11 de julho, o basquete representará as cores do 54º Estado africano, com a partida da Uganda contra o Juba Basketball Complex.