quinta-feira, 6 de outubro de 2011

No Darfur o povo continua a sofrer – venha ouvir um testemunho na primeira pessoa



No dia 13 de Outubro, 5ª feira, às 17h30, na Livraria Bertrand do Chiado, em Lisboa, venha ouvir o testemunho na primeira pessoa de um missionário comboniano, o Padre Feliz Martins, que desde 2006 se encontra na região de Nyala, no sul do Darfur, mas que soma já quase 20 anos de vivência no Sudão. Neste evento, també

m se realizará a entrega simbólica do valor angariado pela Porto Editora referente às vendas da edição do livro "Lágrimas do Darfur", à Plataforma porDafur. Lembramos que por cada livro vendido, 1 euro, revertia para o trabalho da Plataforma porDarfur.

Antes do evento vamos contar com a participação do grupo Tocá Rufar, que na zona circundante à livraria, tocará os seus tambores enquanto serão distribuídos folhetos sobre a iniciativa. Esta acção será integrada na campanha internacional A Beat for Peace, que teve início no Sudão e alastrou-se a todo o mundo, tendo contado com a participação de centenas de artistas internacionais que desta forma fizeram um apelo pela paz no Sudão.

A AI Portugal deseja agradecer às voluntárias Mariana Belo e Sofia Lacerda pela colaboração na concepção gráfica dos materiais para esta acção.

A Plataforma porDarfur é dinamizada pela Amnistia Internacional, Associação Mãos Unidas Padre Damião, Comissão Justiça e Paz dos Religiosos, Fundação Ajuda à Igreja que Sofre, Fundação Gonçalo da Silveira, Missionários Combonianos, Rede Fé e Justiça Europa-África.

sábado, 27 de agosto de 2011

Continua emergência humanitária no Nordeste Africano


Cada 11 semanas, morre 10% da população somali menor de 5 anos

ROMA, sexta-feira, 26 de agosto de 2011 (ZENIT.org) – Pouco mais de um mês após o dramático apelo lançado por Bento XVI, no domingo, 17 de julho, por ocasião da oração mariana do Ângelus, continua a catástrofe humanitária no Corno de África, particularmente na já martirizada Somália: depois do Bakool Meridional e da Baixa Shabelle (especialmente os distritos de Balcad e Cadale), a de Benadir, que compreende a área da capital Mogadíscio, e o chamado corredor de Afgoye.
E tudo indica que as coisas não mudarão muito. “Não cometamos o erro de acreditar que o pior já passou, advertiu em Genebra o porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (UNHCR), Adrian Edwards (Agência EFE, 12 de agosto). “A situação não melhorará, pelo menos até janeiro”, confirmou, por sua vez, a coordenadora das intervenções humanitárias da Fundação Cooperação Internacional (COOPI) na Somália, Gemma Sammartin (Repubblica.it, 4 de agosto).
A emergência se estende também ao norte da Somália, em particular ao Puntland, ou seja, à região semi-autónoma que forma a ponta extrema da África Oriental. “As populações perderam 85% do gado pela seca e a porcentagem de desnutrição aguda chegou a 25% nos campos de refugiados de Bosaso, e a 23,6% na região do Karkaar”, declarou Daniele Timarco, de Save the Children Italia.
Segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), disponíveis em seu site (www.unicef.it, 17 de agosto), pelo menos 12,4 milhões de pessoas afetadas pela seca nos quatro países têm “necessidade imediata, urgente de ajuda humanitária”. As estimativas falam, de fato, de 4,8 milhões no leste da Etiópia, 3,7 milhões na Somália (das quais 2,8 milhões no sul do país), outros 3,7 milhões no nordeste do Quénia e, finalmente, 165 mil no pequeno Jibuti.
Ainda segundo a UNICEF, somente na Somália, 1,85 milhões de crianças precisam de assistência e mais de 780 mil estão desnutridas – 640 mil nas áreas meridionais. Deste último grupo, 310 mil crianças – isto é, quase a metade – sofrem de desnutrição aguda grave. Em todo o Corno de África, 600 mil crianças se encontram em perigo imediato de morte, ao serem afetadas pela desnutrição grave. “Calcula-se – lê-se no Situation Report da Cáritas Somália, enviado à agencia Fides (20 de agosto) – que, a cada 11 semanas, morre 10% da população somali abaixo dos 5 anos.”
Enquanto isso, prossegue o êxodo dos refugiados. Os dados do UNHCR, que na semana passada havia criado um novo site para a emergência no Corno da África [1], impressionam. Basta pensar na situação de Dadaab, a empoeirada cidade do nordeste do Quênia que acolhe atualmente o maior complexo de campos de refugiados. Segundo estimativas da agência da ONU, os diversos campos de Dadaab – Ifo, Dagahaley e Hagadera, mais a chamada "Extension Ifo", com os setores Ifo 2 e Ifo 3 – acolhem quase 440 mil refugiados somalis, um número de habitantes de cidades italianas como Bari (320 mil). Fugindo da carestia, da seca e da violência em seu país, atualmente mais de 140 mil somalis chegaram este ano ao Quênia, dos quais 700 mil nos meses de junho e julho (www.unhcr.it, 19 de agosto).
A constante afluência de refugiados coloca as agências humanitárias diante de uma imensa tarefa. A situação higiênica e sanitária nos campos superpopulados está frequentemente no limite, com todas as consequências, como demonstra o aparecimento de doenças como o cólera, o sarampo e a coqueluche. No complexo dos campo de Dollo Ado (Etiópia), por exemplo, foram registrados, segundo o UNHCR, 166 casos suspeitos de sarampo e 15 falecimentos ligados a esta doença.
Para enfrentar esta enésima emergência, as agências internacionais lançaram uma série de programas de vacinação massiva. Precisamente no complexo Dollo Ado, concluiu na semana passada, no campo de Kobe, uma primeira campanha de imunização contra o sarampo em todas as crianças na faixa dos 6 meses aos 15 anos, e se colocou em marcha uma segunda em Melkadida, que, com seus 40 mil prófugos, é a maior região da Etiópia.
Outro desafio para os agentes humanitários é a contínua violência. Na sexta-feira, 5 de agosto, um tiroteio ocorrido durante a distribuição de alimentos no maior campo de refugiados da capital somali, Mogadíscio (Badbado), provocou 12 vítimas. Segundo algumas testemunhas, a violência começou quando soldados governamentais ou milicianos próximos do fraco governo de transição tentaram roubar uma parte das quase 300 toneladas de ajuda do Programa Alimentar Mundial (WFP). O primeiro-ministro somali, Abdiweli Mohamed Ali, visitou o lugar e se declarou “profundamente incomodado” (guardian.co.uk, 5 de agosto).
Violência e abusos afetam também os prófugos somalis, que, depois de terem caminhado durante dias e noites inteiras, conseguem chegar aos campos do Quênia e da Etiópia. Um novo informe de Human Rights Watch (HRW), divulgado neste mês com o título “You Don't Know Who to Blame”. War Crimes in Somalia [2], denuncia abusos contra os direitos humanos, cometidos inclusive por parte das tropas do AMISOM (a missão da União Africana na Somália) e da polícia do Quênia. Não faltam notícias sobre as mulheres somalis estupradas em Dadaab e nas proximidades por policiais quenianos.
Um capítulo à parte são os combatentes do movimento islâmico extremista al-Shabab, que se retiraram de Mogadíscio, permitindo às tropas governamentais que estendessem o controle a toda a capital, que, segundo estimativas, acolhe cerca de 475 mil refugiados internos, dos quais 100 mil chegaram nos últimos meses. “Eu me pergunto se a de Chabab não é uma retirada estratégica para fazer confluir em Mogadíscio as ajudas humanitárias, para depois voltar de repente e tomar uma parte, ou talvez seus dirigentes tenham advertido a fortíssima pressão internacional (…) e tenham decidido deixar temporalmente a cena da capital somali”, explicou a Fides (8 de agosto) Dom Giorgio Bertin, bispo de Jibuti e administrador apostólico de Mogadíscio.
A ONG americana International Christian Concern (ICC), que denuncia a perseguição dos cristãos no mundo, acusa, por outro lado, os milicianos de al-Shabab de negar deliberadamente, aos cristãos que moram nos territórios controlados por eles, o acesso às ajudas ou a possibilidade de fugir a regiões sob controle governamental, um movimento que faz parte de uma estratégia para erradicar o cristianismo da Somália. “Qualquer somali suspeito de ser cristão ou amigo de um cristão não recebe ajuda humanitária alguma”, afirmou o chefe de uma igreja clandestina (ICC, 15 de agosto). Segundo fontes locais, pelo menos 18 cristãos morreram de inanição nas cidades de Afgoye, Baidawa e Kismayo, após terem sido excluídos das ajudas humanitárias.
Como se sabe, os al-Shabab, que no último verão vetaram três agências humanitárias cristãs, acusando-as de ser missionárias, mostraram-se sempre ferozes diante dos cristãos. Basta recordar as impactantes imagens da degolação, em 2008, de um convertido ao cristianismo, o jovem de 25 anos Mansur Mohammed, por parte dos milicianos islâmicos.
Enquanto isso, a comunidade cristã internacional mantém, junto às demais agências humanitárias, seu compromisso a favor das populações afetadas. Enquanto a Cáritas Somália está coordenando as ajudas procedentes das demais cáritas do Mundo, a organização católica irlandesa Trócaire assiste cerca de 220 mil pessoas no centro-sul da Somália (Fides, 20 de agosto). Por outro lado, os bispos católicos do Quênia lançaram, há algumas semanas, um fundo de emergência – o Catholic Charity Emergency Fund – e dirigiram um apelo para contribuições a favor desta iniciativa (Fides, 4 agosto).
Em nome do Papa Bento XVI, o Conselho Pontifício Cor Unum enviou uma “substanciosa ajuda” a 5 dioceses do Quênia e a 6 dioceses da Etiópia, que “estão enfrentando a emergência humanitária com os poucos meios que têm à sua disposição. Quem fez esta declaração foi o secretário do dicastério, Dom Giampietro Dal Toso, em uma entrevista à Radio Vaticano (12 de agosto). “A presença da comunidade internacional está garantida, mas repito: acho que a atenção deve estar sempre disposta, porque atualmente é a crise financeira que ocupa a maior parte da informação. Mas nesses países e em muitos outros do mundo, existem pessoas que morrem de fome, e no terceiro milênio isso é inadmissível”, afirmou o prelado.
[1] http://data.unhcr.org/horn-of-africa/
[2] http://www.hrw.org/sites/default/files/reports/somalia0811webwcover.pdf

(Paul De Maeyer)

terça-feira, 12 de julho de 2011

Sudão do Sul: finalmente independente


Primeiro país em reconhecer a nova nação foi o próprio Sudão

ROMA, terça-feira, 12 de julho de 2011 (ZENIT.org) – Em uma atmosfera quase de estádio de futebol – com gente até tocando vuvuzelas –, o Sudão do Sul viveu, no último dia 9, o tão esperado dia da sua independência do Sudão, tornando-se oficialmente o 54º país do continente africano e o 193º do mundo.
Na solene cerimônia, realizada na capital Juba, no mausoléu do líder independentista John Garang, que morreu em um acidente de helicóptero em julho de 2005, participaram dezenas de milhares de pessoas, formando, segundo a Neue Zürcher Zeitung (9 de julho), a mais numerosa concentração humana jamais vista na cidade situada às margens do Nilo Branco.
A celebração começou com as orações lidas por dois líderes religiosos, um muçulmano e outro cristão, Dom Paulino Luduku Loro. “Que Deus dê alegria a todo o nosso povo”, rezou o arcebispo católico de Juba, que quis recordar todos os que “nos expressaram sua solidariedade durante os longos anos de guerra” e pediu, além disso, um “novo entendimento” entre o Norte e o Sul (Agence France-Presse, 9 de julho).
O cume do evento chegou quando se recolheu a bandeira sudanesa e se içou a da República do Sudão do Sul, que, depois de Eritreia (1993), é a segunda nação africana nascida de uma secessão. A independência de Juba foi precedida por uma longa e sanguinária guerra civil entre o Norte muçulmano e o Sul animista e cristão que, explodindo em 1955, durou (com uma pausa de 1972 a 1983) até a assinatura do Acordo Geral de Paz (CPA), que se realizou em 9 de janeiro de 2005, na capital do Quênia, Nairóbi, entre o presidente sudanês, Omar Hassan al-Bashir, e os rebeldes do Movimento/Exército Popular para a Libertação do Sudão (SPLA/M) de Garang.
Calcula-se que a segunda fase da guerra civil – a mais cruenta – causou quase 2 milhões de vítimas e mais de 4 milhões de deslocados. “Nossos mártires não morreram em vão”, destacou o presidente do Sudão do Sul, Salva Kiir Mayardit, dirigindo-se à multidão (BBC, 9 de julho). “Esperamos mais de 56 anos até este dia. É um dia que ficará gravado em nossos corações e em nossas mentes”, continuou o ex-chefe rebelde, que usava seu já característico chapéu preto de cowboy.
O primeiro país em reconhecer o Sudão do Sul na sexta-feira foi o próprio Sudão. Segundo a agência Reuters (9 de julho), trata-se de um gesto de boa vontade da parte do regime de Al-Bashir, sobre cuja cabeça pende ainda uma ordem internacional de captura emitida pelo Tribunal Penal Internacional (ICC) de La Haya (Holanda) por crimes de guerra e contra a humanidade, cometidos em Darfur entre 2003 e 2004. Al-Bashir participou também da cerimônia de independência. “Nós nos alegramos com os nossos irmãos do Sul pela criação do seu novo Estado. Compartilhamos sua alegria e sua festa. A vontade das pessoas do Sul deve ser respeitada”, disse o homem forte de Cartum, que pediu aos Estados Unidos que levantasse as sanções contra o seu país (BBC, 9 de julho).
Todos concordam em que, com a independência, começa o verdadeiro trabalho para Juba. Os desafios que esperam o país, um dos mais pobres do mundo, são enormes. O primeiro deles é o da segurança, não só a exterior, mas também a interior. Sobre o terreno do Sudão do Sul agem pelo menos sete movimentos de rebeldes que, segundo Juba, são financiados por Cartum. Para muitos especialistas, o verdadeiro inimigo do Sudão do Sul se esconde, de fato, dentro do país, e são a corrupção e as divisões étnicas.
Depois estão os complicados assuntos das fronteiras com o Sudão, da dívida sudanesa e sobretudo o do petróleo. Enquanto a maior parte dos jazimentos sudaneses (pelo menos 75%) se encontram no território do Sul, a infraestrutura para a exportação do ouro negro ficou nas mãos de Cartum. Ainda que o Sudão do Sul se veja obrigado a chegar a um acordo com o Norte, tudo indica que, para seu desenvolvimento econômico, precisará sobretudo da ajuda dos seus vizinhos Etiópia, Quênia e Uganda.
Como recorda a Reuters (6 de julho), o Sudão do Sul é, de fato, o principal destinatário das exportações ugandesas, que, segundo Uganda Exports Pormotions Board, chegaram, em 2009, a um volume de 184,6 milhões de dólares. No mesmo ano, o Quênia exportou bens e serviços no valor de 157,7 milhões de dólares rumo a Juba. Segundo um informe do centro de consulta Frontiers Economics, uma possível retomada da guerra no Sudão do Sul custaria aos seus vizinhos até 34% do seu PIB combinado durante um período de 10 anos. Juba é, além disso, o candidato mais provável para tornar-se membro da Comunidade da África Oriental (EAC), se os atuais Estados membros (Burundi, Quênia, Ruanda, Tanzânia e Uganda) decidirem ampliar este grupo.
Para o seu desenvolvimento, Juba tem, talvez, um surpreendente ás na manga: poderia tornar-se um destino para os amantes do safári. Como recordou o jornal espanhol El mundo (10 de julho), no Sudão do Sul se esconde um Serengeti “secreto”. Exploradores da sociedade zoológica de Nova York (Wildlife Conservation Society ou WCS) e do National Geographic descobriram, em 2006, uma grande migração em massa de herbívoros, quase maior que a do famoso Parque Nacional do Serengeti, na Tanzânia. Nesta migração participaram até 1,4 milhão de antílopes e outros herbívoros. Junto ao oeste da Etiópia, a região do Sudão do Sul onde se verificou esta migração forma, segundo El Mundo, o maior ecossistema de savana ainda intacto de toda a África.
Enquanto isso, a prioridade absoluta é a criação – quase do zero – de um sistema de saúde e educativo. Com uma população igual à de Milão e Roma juntas – observa Il Corriere della Sera (9 de julho) –, o novo país africano tem menos de 449 mulheres diplomadas na escola superior. Para ajudar neste colossal desafio, as autoridades do Sudão do Sul – um país no qual 1 de cada 10 crianças morre antes dos 5 anos e 1 de cada 10 mulheres morre antes ou depois do parto – há 400 ONGs ativas, além da Igreja Católica. Nestes anos, a diocese de Torit pretende, por exemplo, dedicar 9 milhões de dólares a projetos de desenvolvimento (La Croix, 1º de abril).
(Paul De Maeyer)